Esta interrogação já foi motivo de muitas páginas desde os tempos do Iluminismo. E sobre tal temática já se repetiram quase todas as opiniões, e também confusões. Ele, Deus, foi já reconhecido como o absoluto, o onipotente, o eterno, o infinito, o ser totalizante. Mas foi também desqualificado como invenção fantasmática dos fracos, como projeção dos nossos anseios secretos ou inconscientes, como fonte opiácea de ilusões. E o debate ainda não terminou. Para uns, Deus é essencial. Para outros, é desnecessário. Há os que precisam dele somente nos momentos difíceis. Para uns Ele é um enigma a decifrar (ciência). Para outros, é um mistério a experimentar (fé).
Mas qual é a razão de escolher este tema para a coluna de hoje? É que muitos leitores irão às suas igrejas neste domingo e, se forem católicos, ouvirão um texto do evangelho de João (Jo 6,24-35). A multidão foi à procura de Jesus. Em embarcações atravessaram o lago para encontrá-Lo. E perguntaram-Lhe: “Quando chegaste aqui?” E a resposta: “…Vós me procurais não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e vos saciastes” (Jo 6,26). É fácil perceber que uma foi a pergunta; outra foi a resposta. Do que trata essa descontinuidade?
Como outrora, também hoje há multidões que se expressam religiosas. E Deus é lembrado com frequência. Os que anunciavam o fim do fenômeno religioso se surpreendem. E as conquistas da ciência parecem não bastar. Até mesmo os letrados e os bem alentados nos esquemas científicos se mostram carentes de transcendência. Na realidade, o que aconteceu nos tempos de Jesus ocorre também hoje. Não era a pessoa de Jesus e seus ensinamentos que eles procuravam. Buscavam, sim, as vantagens que aquele “milagreiro” poderia lhes ensejar. Por isso a resposta crítica do Senhor. Não se tratava de adesão de convertidos. Não havia desejo e esforço em direção a um novo modo de ser e de viver. Buscavam a própria saciedade material. Era uma religiosidade de egoístas.
O problema de ontem continua hoje. As expressões são outras. As limitações são as mesmas. Por vezes se expressam em queixas: “Precisei de Deus, rezei, mas não me atendeu”; “Até os desonestos têm sucesso; eu, que creio e me esforço, pareço esquecido por Ele”. Nas horas de dor e sofrimento nossos apelos são ainda mais dramáticos.
Não quero aqui apontar erros. Não pretendo fazer correções. Mas gostaria, sim, de propor a mim e ao leitor o que disse o próprio Senhor àqueles que o procuravam com intenções ambíguas: “Trabalhai não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna”. Esta resposta toca no sentido da vida. Para quem busca a si mesmo, ou se limita àqueles do próprio convívio, tudo se esvazia com o término da própria história e existência. Se fez algo de bom, será lembrado por algum tempo. Mas se esgota. Por outro lado, “trabalhar para o que permanece até a vida eterna” não é mera referência, de impossível demonstração, daquela vida depois da morte. O sentido é outro. É trazer para o presente da vida e da existência aquele mistério experimentado de encontro com Deus.
Sim, se isso se restringir a palavras, claro que tudo permanece no âmbito de uma abstração metafísica. Mas, se alguém quer integrar nos passos de sua vida o encontro com Deus, o caminho da fé se torna uma possibilidade real, que transfigurou os caminhos de muitos. Quando quiseram falar de sua nova vida, as equações não serviram. Mas a paz testemunhada ilustrou.