Ecumenismo: caminho para a unidade?

Gestos e pronunciamentos do Papa Francisco têm estimulado a “cultura do encontro”, do diálogo e da cooperação entre Igrejas e Religiões. Assim, é importante e propício refletirmos sobre nosso empenho ecumênico como Igreja Católica.

Confira a seguir texto de nossa Comissão do Ecumenismo e Diálogo Inter-Religioso. No texto são apresentados os fundamentos teológico-pastorais que orientam o ecumenismo e as expressões concretas deste em nossa Arquidiocese, incluindo parcerias com outras igrejas, organismos e iniciativas de cunho ecumênico e inter-religioso.

Escolhemos lançar este tema pois trata-se de uma necessidade da igreja. A igreja precisa do ecumenismo para realizar a sua natureza e vocação à unidade. Não há várias igrejas, pois “O Cristo Senhor fundou uma só e única Igreja” (UR 1).

Neste texto o leitor pode conhecer também o Movimento Ecumênico de Curitiba.

CONFIRA:

O que é ecumenismo

O Concílio Vaticano II (1962-1965) marca de forma irreversível o envolvimento e compromisso da Igreja Católica com o movimento ecumênico (ME). No documento Unitatis Redintegratio (UR), assumido como a carta magna do ecumenismo católico, o ME é definido como “as atividades e iniciativas, que são suscitadas e ordenadas, segundo as várias necessidades da Igreja e oportunidades dos tempos, no sentido de favorecer a unidade dos cristãos” (UR 4). Tais iniciativas são valorizadas a partir de quatro aspectos:

1) ela é “suscitada”, não surge e nem acontece ao acaso, mas como impulso da ação do Espírito Santo num contexto, tempo, lugar e nas circunstâncias que exigem a ação ecumênica;

2) ela acontece de forma organizada, “ordenada” no conjunto da ação eclesial, com objetivos, métodos e fins específicos;

3) trata-se de uma “necessidade da igreja”, ou seja, a igreja precisa do ecumenismo para realizar a sua natureza e vocação à unidade e comunhão – o ecumenismo é algo constitutivo do ser eclesial;

4) a meta das atividades e iniciativas ecumênicas é a unidade dos cristãos, a comunhão eclesial. Não se trata de uma aproximação superficial ou unidade parcial; busca a comunhão plena na fé, nos sacramentos, nos ministérios, com estruturas eclesiais que lhe deem visibilidade (UR 3).

A unidade buscada está sintonizada com a unicidade da Igreja: não há várias igrejas, pois “O Cristo Senhor fundou uma só e única Igreja” (UR 1), e ela se mantém “única” (Lumen Gentium – LG 8), “una e única” (LG 23; UR 3.24), como o Povo de Deus “uno e único” (LG 13.32; AG 1.7), o único rebanho de Cristo (LG 15; UR 2; Ad Gentes– AG 6), no qual todos os membros formam um só Corpo de Cristo (LG 7; UR 3; AG 7). A meta dos esforços ecumênicos é a recuperação da visibilidade histórica desta unidade, situada no âmbito espiritual, sacramental, institucional, e que foi perdida nas experiências de desencontros protagonizadas pelos cristãos. Na convicção que a unidade é, primeiramente, dom de Deus, e na atitude penitencial frente as culpas no processo da divisão, aspira-se a “unidade na diversidade”. Esta não corresponde à uniformidade institucional, mas no reconhecimento na caridade dos elementos da Igreja de Cristo presentes em suas diferentes expressões históricas (UR 3).

Dimensões do ecumenismo

O ensinamento conciliar incentiva todo tipo de iniciativa que favoreça à unidade, fortalecendo o ecumenismo em quatro dimensões, intrinsecamente interligadas:

a) o ecumenismo como uma atitude, um comportamento dialogante frente às diferentes igrejas, eliminando palavras, juízos e ações que não correspondam à condição destas (UR 4);

b) o ecumenismo teológico, para aprofundar a doutrina cristã nas várias tradições eclesiais, distinguindo o “conteúdo” e as “formas” de explicitação das verdades da fé, e compreendendo que existe uma “hierarquia das verdades” católicas, que mostra “o diverso nexo com o fundamento da fé cristã” (UR 9.11);

c) o ecumenismo social, que favorece a corresponsabilidade das igrejas em iniciativas pastorais e sociais concretas pela justiça social e ambiental, a promoção humana, a superação da violência, etc. (UR 12);

d) o ecumenismo espiritual, considerando a oração “a alma de todo o movimento ecumênico” (UR 8).

Na ciência de que “a solicitude na restauração da união dos cristãos vale para toda a Igreja” (UR 5), essas dimensões não só a comprometem institucionalmente, mas também precisam envolver a vida cotidiana das comunidades eclesiais. O agir da Igreja articulado na sua ação evangelizadora necessita expressar em seus diferentes níveis – local, regional, nacional – os princípios ecumênicos que a constituem.

Da mesma forma, o empenho ecumênico acena para a abertura e envolvimento da comunidade cristã no diálogo inter-religioso, assumido enquanto relação dialógica e colaborativa com outras religiões, em vista do desenvolvimento de bens espirituais e morais por meio dos valores socioculturais presentes na diversidade religiosa (Nostra Aetate – NA, 2).

O ecumenismo em nossa arquidiocese

De acordo com o Diretório para a aplicação dos princípios e normas sobre o ecumenismo, do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos, as Igrejas particulares são o espaço favorável para o desenvolvimento das iniciativas ecumênicas, tendo em vista as condições de proximidade espiritual, étnica, política e cultural com outras Igrejas e Comunidades Eclesiais (n. 37). Sob indicativos do referido Diretório, cada diocese busca articular e estruturar a caminhada ecumênica a partir da conjuntura e recursos de que dispõe.

Na Arquidiocese de Curitiba, a Comissão de Ecumenismo e Diálogo Inter-religioso constitui uma das comissões pastorais arquidiocesanas e integra o Plano da Pastoral de Conjunto da Arquidiocese de Curitiba desde o ano de 2006. Seu objetivo é sensibilizar a Igreja local para o empenho ecumênico, ao mesmo tempo em que dinamiza iniciativas e vivências ecumênicas no campo celebrativo, formativo e de atuação socioeclesial. Presidida por um assessor eclesiástico, a Comissão busca reunir pessoas com sensibilidade ecumênica para serem agentes da unidade junto às comunidades e paróquias, ao mesmo tempo em que estabelecem parcerias com outras igrejas, organismos e iniciativas de cunho ecumênico e inter-religioso.

O Movimento Ecumênico de Curitiba – MOVEC

Caminhando em estreita proximidade com a arquidiocese, o MOVEC tem sido o espaço privilegiado do contributo católico na caminhada ecumênica local. Fruto de diálogos estabelecidos desde a década de 1960, o movimento conta atualmente com a representação efetiva das igrejas Católica Apostólica Romana, Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), Igreja Episcopal Anglicana do Brasil (IEAB) e Igreja Ortodoxa Ucraniana, bem como do Movimento Focolares. Além destes, outras igrejas, e grupos cristãos e inter-religiosos caminham em sintonia com o MOVEC a partir das iniciativas que desenvolve. Merece destaque a cooperação junto ao Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC) e ao Núcleo Ecumênico e Inter-religioso da PUCPR (NEIr).

Uma das iniciativas mais expressivas do MOVEC é a dinamização da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos (SOUC), realizada anualmente na semana que antecede Pentecostes. Além de explicitar a comunhão orante com os cristãos do mundo todo que a celebram, a SOUC possibilita a aproximação entre as comunidades cristãs, permitindo, assim, que a prática ecumênica não se limite às estruturas e lideranças que a articulam, mas que fecunde a vida das pessoas e suas vivências comunitárias.

As Campanhas da Fraternidade Ecumênica (CFEs), este ano em sua quarta edição (2000, 2005, 2010 e 2016), têm sido uma demonstração peculiar do diálogo entre cristãos no Brasil. Envolvidas pela mística do tempo quaresmal e motivada pela CONIC e organismos parceiros, a comunidade cristã é conclamada a trilhar o caminho reconciliador de suas diferenças, ao mesmo tempo em que oferece um testemunho público do compromisso cristão com o bem comum, com a promoção da paz e da justiça ecossocial. Nesta esteira, o MOVEC tem procurado contribuir, assumindo a CFE em seu cronograma de atividades e projetos.

O ecumenismo é, acima de tudo, o encontro fraterno de pessoas que, em Cristo Senhor e Salvador, se reconhecem irmãos e irmãs. É essa base de fé comum que sustenta e impulsiona o compromisso das igrejas com a unidade, que reside no centro da Jesus ao Pai: “Para que todos sejam um” (Jo 17, 21). Sob perspectivas eclesiológicas diferenciadas, as igrejas reconhecem e assumem sua natureza dialógica. Isso pode ser exemplificado pela partilha testemunhal que nos é dada pelas igrejas que integram o MOVEC.

Confira Testemunhos de Igrejas que integram o MOVEC:

“A Igreja Ortodoxa tem o ecumenismo em seu DNA em virtude da sua estrutura administrativa, com¬posta principalmente de 14 igrejas autocéfalas em plena comunhão da fé. Esta estrutura patriarcal e esta unidade da fé fazem com que cada cristão ortodoxo reconheça no outro esta comunhão. Na prática, esta diversidade acaba sendo extensiva a todo cristão, mesmo não sendo ortodoxo. A práxis ortodoxa não é proselitista, ou seja, quando um ortodoxo encontra-se com outro cristão não-ortodoxo alegra-se imediatamente porque reconhece neste outro a sua mesma essência, os mesmos valores, os mesmos objetivos evitando a todo custo tocar em pontos que poderiam vir a ser polêmicos. Paradoxalmente, essa aceitação do outro reforça a sua própria fé sem nenhuma necessidade de absorver os valores teológicos do outro” (Pe. Luís Filidis – Eparquia Ortodoxa Ucraniana).

“A IECLB acredita que mais importante do que fazer um nivelamento das doutrinas é estabelecer um diálogo que permita superar as barreiras humanas. É preciso que as igrejas se respeitem mutuamente e lutem por um só ideal: a divulgação do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo. Questões de forma, de costumes e de jeitos de celebrar não podem destruir o que nos une: a fé no mesmo Deus. A IECLB aposta na caminhada ecumênica de tal forma que o afirma em sua constituição, art 5, parágrafo segundo: “a natureza ecumenica da IECLB se expressa pelo vínculo de fé com as igrejas no mundo que confessam Jesus Cristo como único Senhor e Salvador.” (P. Alfredo Jorge Hagsma – IECLB).

“Nossa história é marcada pelo compromisso com o diálogo ecumênico. Fomos fundadores do CONIC, sendo um bispo anglicano seu atual presidente. Em Curitiba trabalhamos em conjunto com a Pastoral do Povo da Rua da Igreja Católica num projeto semanal de acolhida à população de rua, além de fazermos parte do MOVEC” (Emerson R. Silva, secretário diocesano – Diocese Anglicana do Paraná).

COMISSÃO DO ECUMENISMO E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO: Pe. Volnei Carlos de Campos/ Animação Ecumênica e MOVEC – (41) 3085-2827

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Por
Pe. Elias Wolff e Ir. Raquel de Fátima Colet, FC