O que é a Divina Misericórdia e o que ela significa nos dias atuais?

Neste Domingo em que a Igreja celebra a Divina Misericórdia, a Arquidiocese de Curitiba traz para reflexão um artigo do Pe. Francisco Anchieta, reitor do Santuário da Divina Misericórdia de Curitiba.

 

 

“Caríssimos irmãos e irmãs, venho através deste partilhar um pouco sobre este grande atributo de Deus que é a Sua Misericórdia. Desde já, saliento que aquilo que se fala sobre a Divina Misericórdia a partir da devoção propagada em nosso tempo, enquanto Misericórdia infinita, jamais poderá defini-la naquilo que ela é em si mesma. Se fosse para resumir em poucas palavras, poderíamos dizer que a Divina Misericórdia é o amor infinito de Deus por seus filhos e filhas.

No entanto, para chegarmos a isso, faz-se necessário falar da Divina Misericórdia enquanto uma devoção que, hoje, é proclamada, divulgada e buscada em diversas partes do mundo. Uma devoção que surge ainda no século XX, mais especificamente na Polônia – entre os anos 1930 e 1938 –, através da experiência vivida por uma religiosa chamada Irmã Faustina – hoje Santa Faustina, que nasceu no ano de 1905 e faleceu em 1938.

Ao longo da história, percebemos que diversas são as formas pelas quais Deus se revela e cuida do seu povo, o que se dá em fatos – dos quais encontramos relatos mais antigos, na Sagrada Escritura, mas também em outros escritos históricos, quando compreendidos de um ponto de vista da fé. Esse cuidado também se dá através de pessoas que, a exemplo de Faustina, vivem suas experiências pessoais como benefícios particulares, mas são especialmente colocadas a serviço de outros. Outras devoções também podem servir de exemplo, dentre as quais cito a do Sagrado Coração de Jesus, o qual é “manso e humilde” – muitas pessoas experimentaram e partilharam essas vivências.

É importante salientar também que a Misericórdia Divina enquanto devoção não se trata de uma novidade em si, um invento novo que, às vezes, acaba por ainda encontrar algumas resistências. Na realidade, a Divina Misericórdia, enquanto devoção, se refere a uma forma contemporânea de falar e experimentar o amor misericordioso de Deus para com a humanidade. De um ponto de vista do Diário de Santa Faustina, podemos dizer que é: “[…] a transmissão de novas formas do culto da Misericórdia Divina, cuja prática haverá de conduzir à renovação da vida cristã em espírito de confiança e misericórdia” (Diário, p. 8–9).

santa-faustinaUma vez mencionado o Diário de Santa Faustina, faz-se necessário esclarecer que ele se trata de um livro no qual a religiosa relata sua experiência da misericórdia – relatos feitos, mais especificamente, nos seus últimos quatro anos de vida, entre 1934 e 1938. O diário é, além da Sagrada Escritura e os documentos da Igreja, uma das bases de orientação para essa devoção. Nele, encontramos todos os aspectos trabalhados na devoção, desde as explicações sobre o quadro de Jesus misericordioso e seu significado, o Terço da Misericórdia, a Festa da Divina Misericórdia, as obras de misericórdia, etc. Tudo isso, hoje, é aprovado e oficializado pela Igreja, quebrando a ideia que ainda pode insistir de que se trata de um culto ou devoção particular.

Chamo a atenção para o fato de que não basta conhecer, saber tudo sobre a Divina Misericórdia, falar ou experimentar apenas. A Misericórdia precisa ser vivida e praticada! Para isso, tomemos, portanto, a ideia de que “Deus amou o mundo de tal maneira, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus não enviou o Filho ao mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por ele” (Jo 3, 16–17). Aqui, percebemos que não estamos simplesmente a mercê de nossa sorte.

Voltando um pouca na História – ali estão as marcas dos desafios de cada tempo, enfrentados pela humanidade, uns maiores outros menores –, percebemos que a humanidade não para nos problemas e desafios de suas épocas, mas continua até chegar aos nossos dias. E, independente do que aconteceu, é notável a ação do Deus libertador que cuida e está sempre atento às necessidades do seu povo. Enxergamos a ação do Deus que se mantém fiel, mesmo quando esse povo age com infidelidade. Isso gera um questionamento sobre a situação em que o mundo e a humanidade vivem na atualidade.

Reflitamos: será que não precisamos buscar mais a Deus? Claro que deve existir uma responsabilidade e comprometimento, social, político, homem e sociedade. Mas onde Deus se encontra neste momento da nossa História? O mundo sofre, a humanidade sofre. Guerras, desrespeito, egoísmo, corrupção, inversão de valores, que geram, cada dia, cada vez mais desconfiança, desespero, esvaziamento, violência.

Em meio a tudo isso, o maior desafio está no resgate da confiança e da esperança no Deus que jamais abandonou seus filhos e filhas, seu povo eleito. Nisso, a mensagem e a devoção à Divina Misericórdia, conforme revelada a Santa Faustina, para os nossos tempos, se atualiza como algo urgente para a humanidade. Poderíamos dizer que a própria Misericórdia é o grande grito de Deus pedindo que seu povo se volte com confiança para Ele, para sua Misericórdia.

Em seu diário, Faustina escreveu como sendo as próprias palavras de Jesus: “As almas se perdem, apesar da Minha amarga Paixão. Estou lhes dando a última tábua de salvação, […]” (D. 965). Ou ainda, “A humanidade não encontrará paz enquanto não se voltar com confiança para a Minha misericórdia” (D. 300).

Disso, podemos perceber e reafirmar a presença cuidadosa de Deus que, mais uma vez, quer cuidar, libertar e direcionar os seus, envolvendo-os, restaurando-os com a Sua misericórdia e transformando-os em instrumentos de misericórdia na vida dos outros. Que o próprio Deus nos capacite a acolher o seu apelo e que, aderindo ao seu projeto redentor, digamos sempre: Jesus, eu confio em Vós!”

 

Pe. Francisco Anchieta Cardoso de Muniz, MIC.

Santuário da Divina Misericórdia

pe.anchietamic@gmail.com