Padre Marcondes: Uma Igreja em estado permanente de missão

 

Ao iniciarmos esta reflexão, é importantíssimo lembrar que a Igreja é por sua natureza missionária como afirma o decreto Ad Gentes: “A Igreja peregrina é, por sua natureza, missionária, visto que tem a sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na “missão” do Filho e do Espírito Santo” (AG 2). Assim, a Igreja é vista como essencialmente missionária. É importante também lembrar que o Espírito Santo continuamente atua na história e é o protagonista principal da missão. Desde os primórdios da Igreja vem atuando na evangelização e abrindo novas fronteiras na realização do Reino de Deus no mundo e concretamente, no meio de nós. Logo, com todo o seu vigor, interpela-nos através dos sinais dos tempos, da concretude da vida, à prosseguirmos e respondermos criativamente aos desafios de cada momento histórico, com a mesma lucidez e sabedoria que emana do mestre Jesus de Nazaré.

O Documento de Aparecida, quando reconhece e reafirma o “despertar missionário” da Igreja na América Latina e no Caribe, convoca todos os seus membros a se colocarem em estado permanente de missão (DAp n. 551). Esta convocação nos impele a sair de um marasmo eclesial que leva a um cansaço e estagnação da ação pastoral e a reassumirmos o espírito renovador do Vaticano II, em um permanente diálogo com as diversas culturas, com a sociedade e com o cotidiano das pessoas, nos comprometendo em favor da vida em todos os seus âmbitos (Jo 10,10). Assim conclama o Papa Francisco “Não nos deixem roubar o entusiasmo missionário!” (EG n. 80)

Para uma Igreja em estado permanente de missão, se faz necessário, iniciar um processo criativo reorientando o modelo de crer, de formar e edificar a comunidade, de recriar as relações interpessoais, comunitárias e eclesiais, oferecendo a todos o Evangelho de Jesus Cristo como uma eterna novidade, assumindo com renovado ardor missionário e criatividade o anúncio querigmático e uma nova evangelização que proclame o Evangelho da justiça, inspirando um profetismo eclesial, empoderando-se do mandato missionário: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa-Nova a toda criatura …!” (Mc 16,15; Mt 28,19-20). Assim, é pela fé em Jesus, suscitada, acolhida e partilhada que nasce a comunidade de discípulos missionários – “Não nos deixem que nos roubem a alegria da evangelização” (EG n. 83).

A comunidade de discípulos missionários é marcada e identificada por uma ação missionária e pastoral atraente, envolvente, personalizada, comunitária, dialogante, servidora, ministerial e motivadora das relações entre iguais, superando as relações desiguais e testemunhando a comunitariedade, a comunhão, a acolhida, a misericórdia, a compaixão, a participação corresponsável e atenta ao mundo e à profundidade da fé. Viver a fé cristã é sentir-se amado pelo Pai, salvo em Jesus e fortalecido no Espírito Santo. – “não deixemos que nos roubem a comunidade” (EG n. 92).

Atualmente a configuração social é marcada pela mobilidade, pluralidade e constantes e rápidas mudanças e os fundamentos de estabilidade e homogeneidade presente na Igreja, “fazer sempre do mesmo jeito” não conseguem mais responder a estes e outros desafios presentes. Logo, somos desafiados a formar comunidades numa dinâmica pastoral marcada pela dinamicidade, mobilidade, pluralidade; uma Igreja em saída. Uma Igreja consciente da sua história, de seus valores e tradições, mas com uma ação missionária e evangelizadora descentralizada, criativa, dialogante e abrangente. Uma Igreja em estado permanente de missão, exige lucidez e consciência para buscar caminhos que correspondam às necessidades da humanidade hoje. Nos diz o Papa Francisco: “Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! … prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças …” (EG n. 49).

Portanto, desafiados por esta consciência e lucidez a sair de uma estrutura de Igreja (paróquias, comunidades, pastorais , movimentos, instituições), em geral rígida e de forte presença hierárquica e condicionada por uma herança colonizadora que impede uma evangelização autêntica e evangélica à assumir uma nova dinâmica capaz de personalizar e promover um intercâmbio de vida comunitária, comunidade de fé, samaritana e acolhedora, com intenso compromisso comunitário e social, capaz de ser profética, priorizando a centralidade relacional da vida. Pois, é urgente um testemunho evangelizador que se da na vivência da experiência do amor trinitário na comunidade e não restringir-se à simples e mera administração. Logo, não cumprir essa função evangelizadora é omitir-se enquanto instrumento do Reino.

Então, uma Igreja que se coloca em estado permanente de missão, vive seu discipulado tendo como referência a simplicidade, a humildade, a escuta, o diálogo, a confiança plena no Espírito Santo, aberta às necessárias reformas espiritual, pastoral e também institucional (DAp n. 367). Passando por uma verdadeira conversão integral do Povo de Deus (DAp n. 365). Certamente essa metanoia acontece no agir eclesial, assumindo atitudes permanentes de conversão pastoral (DAp n. 365), passando de uma “pastoral de conservação” para uma “pastoral decididamente missionária” (DAp n. 370); consequentemente, abrindo-se para uma renovação eclesial e uma missionariedade presente em todas as estruturas eclesiais (DAp n. 365) como recorda Aparecida. Todavia, os desafios existem. Não sejamos ingênuos! Mas na força e na escuta do Espirito Santo, estes desafios podem ser superados. Confiantes neste Novo que se apresenta na Igreja e no mundo, caminhemos na alegria e com uma dedicação cheia de audácia e esperança em atitude permanente de missão. – “Não deixemos que nos roubem a força missionária!” (EG 109).

Que Maria à mãe do Evangelho vivente, a estrela da evangelização, interceda por toda a Igreja, a fim de que nos coloquemos sem cessar em estado permanente de missão e como discípulos/as missionários/as, portadores da Alegria do Evangelho.

Por Pe. Marcondes Martins Barbosa – Sacerdote diocesano de Curitiba – Mestrando missiologia na Pontifícia Universidade Urbaniana de Roma

Assessor Eclesiástico da Comissão da Dimensão Missionária da Arquidiocese de Curitiba

Abreviaturas
AG – Ad Gentes
DAp – Documento de Aparecida
EG – Evangelii Gaudium.

Referência Bibliográfica
BRIGHENTI, Agenor; HERMANO, Rosario (orgs.). A MISSÃO EM DEBATE: PROVOCAÇÕES À LUZ DE APARECIDA. São Paulo: Paulinas, 2010.
MIKUSZKA, Gelson Luiz. POR UMA PARÓQUIA MISSIONÁRIA: À LUZ DE APARECIDA. São Paulo: Paulus, 2012.

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